Uma forte campanha para combater a obesidade entre crianças e adolescentes foi iniciada pelo governo em março deste ano. A iniciativa nasceu de dados que assustam: segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 34,8% das crianças de 5 a 9 anos estão acima do peso.
Os dados comprovam o que muitos médicos veem diariamente: “O número de obesos na população infanto juvenil há tempos já supera os índices de desnutrição”, diz a endocrinologista Daniela Telo, especializada em obesidade pelo Hospital das Clínicas de São Paulo. E o cenário deve se refletir nos números da obesidade entre adultos, já que se uma criança gorda é forte candidata a viver em guerra com a balança. “Quanto mais cedo o excesso de peso se instalar, mais grave e difícil serão suas consequências e seu tratamento”, avalia a médica.
A endocrinologista acredita que existem vários motivos para o “boom” de excesso de peso, mas ressalta que os principais vilões são a grande oferta de alimentos industrializados com excesso de calorias, o enorme apelo desses produtos às crianças e o tempo à frente do computador e da televisão.
Além disso, estudos mostram que crianças de baixo peso ao nascer, prematuras, ou cujas mães sofreram doenças como o diabetes na gestação, estão propensas a ter obesidade na infância e na adolescência.
VEJA UM EXEMPLO DE CARDÁPIO
DESJEJUM
- 1 xícara de leite semidesnatado com café com pouco açúcar
- 1 minipão frances com requeijão
- ½ papaya
LANCHE
- 1 iogurte desnatado com 2 colheres (sopa) de granola
ALMOÇO
- salada de alface, tomate, pepino temperado com 1 colher (sobremesa) azeite extra virgem, limão e sal (pouco)
- 3 colheres sopa de carne moída com mandioquinha picada
- 2 colheres (sopa) de arroz integral
- 2 colheres (sopa) de feijão
- 2 colheres (sopa) de cenoura refogada
- 1 fatia media de melão
LANCHE
- 2 torradas com geleia sem açúcar
- 1 copo de suco natural
JANTAR
- salada de rúcula e beterraba temperada com 1 colher (sobremesa) azeite extra virgem, limão e sal (pouco)
- 1 filé de peixe assado com ervas
- 1 xíc de chá de macarrão com molho de tomate
- 1 cacho pequeno de uva
CEIA
- 1 copo (200 ml) de leite semidesnatado
Fonte: Ana Paola Monegaglia Vidigal - nutricionista, diretora da Nutribalance Consultoria Nutricional e socia-proprietária da Papa Gourmet, congelados orgânicos para bebes e crianças
Outro fator que pode interferir é a genética. Se os pais são magros, a probabilidade de o filho ter excesso de peso fica entre 10% a 15%. Mas se a mãe ou pai é obeso, o risco sobre para 50%. E se ambos são obesos, a probabilidade é de 80%. Os dados são do livro “Nova Dieta de Pontos para Crianças e Adolescentes”, escrito pelo endocrinologista Alfredo Halpern, com a ajuda de duas nutricionistas, Mônica Beyruti e Ana Paola Monegaglia Vidigal.
O médico, que também é professor do grupo de obesidade do Hospital das Clínicas da USP (Universidade de São Paulo), adaptou a sua dieta de pontos para crianças acima de 7 anos e adolescentes. “A minha experiência de cuidados com obesidade infantil mostra que uma das maiores alegrias é encontrar pessoas adultas que já foram crianças e adolescentes gordinhos e que hoje vivem com o peso normal”, afirma Halpern. Para ele, são pessoas que conseguiram mudar seu estilo de vida e, por isso, terão menos doenças.
O papel dos pais
Se entender que é preciso mudar hábitos já é complicado para adultos, imagine para crianças. Justificar a necessidade de perder peso pelas consequências à saúde em geral é pouco efetivo para esse público. “Vale a pena apelar aos bons hábitos ou exemplos, como irmão mais velho, pai, bons jogadores ou pessoas que a criança admira. Temos de evitar comparações negativas”, afirma Telo.
A coautora do livro da dieta dos pontos e diretora da Nutribalance Consultoria Nutricional, Ana Paola Monegaglia Vidigal, acredita que a maior dificuldade é envolver os pais. “Eles são fundamentais para adesão e cumprimento das orientações que são passadas a criança. Eles fazem as compras e vão elaborar as refeições”, afirma a nutricionista. “É fundamental a participação de todos no processo, para que o resultado seja positivo”, acrescenta.
A nutricionista Alessandra Rodrigues, mestre em ciência da saúde pela Faculdade de Medicina da USP e especialista em nutrição clínica pelo Ganep, concorda que a dificuldade está na rotina que os pais colocam em casa: “A falta de regras, uma dispensa e geladeira recheadas de bombas calóricas são tentações. Os pais devem entender a necessidade para poder tratar os filhos”. Como as crianças aprendem com adultos, se os hábitos dos pais são pouco saudáveis, provavelmente a criança vai aprender a se alimentar da mesma maneira.
Para Telo, além da família, também é preciso haver participação de um grupo de profissionais e até da escola. “A fórmula mais eficaz de sucesso no envolvimento de todos se faz por uma equipe multidisciplinar, com endocrinologista ou pediatra, nutricionista e psicólogo infantil. Uma equipe alinhada vai conseguir montar estratégias consistentes e eficientes para uma nova rotina e isso vai trazer segurança para todos”, descreve.
Dicas dos especialistas
Os adultos da família podem ajudar de diversas formas: comprar alimentos mais saudáveis, preparar refeições leves, estimular a participação em algum esporte e, se possível, unir-se às crianças na prática de atividade física nos fins de semana. “Ainda que haja um irmão/irmã que é magrinho (a), os pais devem comer e ter em casa alimentos mais saudáveis, que façam parte do novo cardápio”, aconselha Rodrigues.
A criatividade também é bem-vinda: “crie opções interessantes, como um cachorro quente magro - com pão francês integral mini e salsicha de aves, ou uma pipoca light”, ensina a nutricionista.
“Assim como os adultos, as crianças comem com os olhos, por isso decore o prato de uma maneira alegre. Varie as preparações, como utilizar abobrinha ralada no arroz em vez de refogá-la, fazer um suflê de brocólis ou espinafre batido com arroz para ser assado em forma de bolinho”, sugere Rodrigues.
Os pais devem ficar atentos também para as famosas “trocas”. “Nunca tente recompensar a criança, dizendo que se comer tudo que está no prato vai ganhar sobremesa. O correto é estimular durante a semana uma alimentação equilibrada e deixar as guloseimas para o final de semana”, complementa.
“Nas dietas para crianças e adolescentes, costumamos liberar guloseimas de uma a duas vezes por semana. A dieta não pode ter a conotação de proibição. Dentro de uma reeducação alimentar, todos alimentos devem ser incluídos, um com mais cautela que o outro, mas jamais proibido. A dieta dos pontos permite isso, dentro do limite de pontos para cada um”, afirma Vidigal.